sábado, 23 de julho de 2022

A TRADICIONAL FESTA DOS VAQUEIROS DO DISTRITO DE CAIÇARA

por Dr. Lima

O Distrito de Caiçara, localizado no município de Cruz-CE, foi criado pela Lei Estadual Nº 11.323 de 22 de maio de l987, mas a Festa dos Vaqueiros e Criadores começou há mais de cem anos, com a chegada dos primeiros pecuaristas à região, entre eles: Francisco Pereira, Manoel Jacinto, Pedro Jacinto, Antônio Jacinto, José Jacinto, Antônio Pereira Brandão (mais conhecido por Antônio Valdo), Manoel Valdo, José João Serafim Marques, Pedro Anselmo e Samuel. A Festa consiste em reunir vaqueiros e criadores da região onde hoje fica a APA (Área de Proteção Ambiental) de Jericoacoara e entorno, nos meses de abril a julho, para campear o gado, levar para o curral, fazer a ferra dos animais, selecionar alguns para venda ou troca, vacinar contra a doença do quarto inchado. Hoje, também são aplicadas vacinas contra as doenças sob o controle do Governo, constantes no calendário dos programas de sanidade animal. Quando é encontrado um animal de outros criadores (que não se encontra presente neste evento) no meio do gado, é identificado e afastado do rebanho ainda no campo. São três dias de trabalho, juntando os animais para fazer os serviços que forem necessários. Ninguém ganha nada pelo serviço, que é feito de forma voluntária na base de mutirão da solidariedade. Todos fazem questão de citar que conservam a tradição do vaqueiro nordestino, seja de roupa simples ou usando o uniforme completo (perneira, chapéu, gibão, guarda peito, chinelo e chicote). A maioria dos criadores tem suas marcas de ferrar gado registrado na SDR. Os cavalos são bem adestrados para fazerem a lida diária com o gado. A criação do gado é toda feita de forma extensiva e a exploração leiteira destina-se ao consumo da família. Não há aproveitamento comercial do leite, a produção de animais destina-se quase que exclusivamente ao abate, sendo comercializado na própria região. A venda é feita de acordo com a necessidade dos criadores. A principal área de criação fica situada entre o mar e a Lagoa de Jijoca. Os criadores reclamam que com a instituição da Área de Proteção Ambiental de Jericoacoara e a cerca das propriedades, ficou mais difícil para o desenvolvimento de suas criações de modo extensivo, até porquê o rebanho bovino tem aumentado muito nos últimos anos. Outro fator que vem dificultando a atividade pecuária é a estrada que passa pela região, a CE-085, pois quando os animais chegam à estrada são apreendidos e levados para a Regional de Itapipoca acarretando prejuízos para os criadores, pois para terem os seus animais de volta são obrigados a pagarem taxas e o transporte para o retorno dos animais. A estrada tem cercas nas laterais, mas os caminhos de acesso às comunidades não tem porteiras, o que permite que os animais cheguem até a estrada. Cada ano um grupo de criadores fica responsável pela organização e despesa da festa que consta em matar um boi para o almoço, aquisição de bebidas quentes, refrigerantes ou água de coco, que são consumidos à vontade. O convite é feito pessoalmente pelos próprios promotores do evento. Não há propaganda nem divulgação pelos meios de comunicação. A diversão é grande onde trabalho e brincadeiras se misturam diante dos olhos dos familiares que se aglomeram ao redor do curral, vindos de outras localidades ou até de outros municípios vizinhos. Também vem gente da região que moram em outros Estados e aproveitam este período para voltarem a sua terra natal e participarem da festa. A festa é familiar. Só participam os criadores, vaqueiros que lidam com o gado, seus familiares e algumas pessoas que forem especialmente convidadas. Não há presença nem apoio de políticos. A festa e as despesas são dos criadores para seus familiares. Fazem parte das animações, a música com temas de vaquejada. Muito raramente também despontam aboios e cantorias improvisadas apresentadas pelos próprios vaqueiros que entre uma prosa e outra fazem versos exaltando o trabalho de seus colegas. Os principais improvisadores é a dupla de vaqueiro José Arnoldo, da Comunidade de Castelhano, e Olavo da comunidade de Córrego dos Anas. Hoje, já está sendo permitida a presença de carros de som, mas nunca houve festa dançante. Os vaqueiros e criadores que fazem parte da festa são, na maioria das vezes, moradores das comunidades vizinhas de Caiçara, como: Córrego dos Anas, Cavalo Bravo, Formosa, Castelhano, Preá, Lagoa Grande, Castainho e Corguinho dos Jacintos. Cada ano a festa é realizada em uma comunidade diferente conforme seja a residência do anfitrião. Anualmente, cerca de trinta vaqueiros participam desta festa que é registrada através de fotografias e até filmagens. É uma tradição que passa de pai para filho. Logo sedo a garotada já se prepara para seguir a tradição dos seus pais que só abandonam a profissão quando a idade já não lhe permite mais desenvolver a atividade. Para isto os jovens praticam a montaria e até fazem pequenas vaquejadas exclusivas para jovens, como uma forma de prepararem-se para seguirem aos seus pais. Na lida com o gado, o registro de acidentes envolvendo os vaqueiros é caso muito raro. Pedro Brandão de Sousa (Pedro Valdo) foi acidentado quando o cavalo em que corria caiu e ele foi obrigado a passar vários dias hospitalizado em Sobral. Outro acidente foi com José Jacinto, que passou quatro dias no hospital após cair e ser pisoteado pelo cavalo.. O gado é todo sem raça definida, de pequeno porte, que os criadores chamam de raça mirim ou pé-duro, mas são animais resistentes e muito bem adaptados ao clima da região. Já houve tentativa de introduzir animais vindos de outras regiões, mas a adaptação é muito difícil e poucos conseguem sobreviver.

Alguns vaqueiros também fazem as suas proezas. Quando tem um boi para ser campeado, reúne-se um grupo de vaqueiros e vão para o campo. Vez por outra um vaqueiro foge do grupo e, sozinho, pega o boi e amarra para depois então avisar aos companheiros e mostrar a sua bravura. Terminada a festa o gado é devolvido ao campo. Vez por outra, reúne os companheiros e vão visitar os bois no pasto. Atualmente, há necessidade de vigilância constante, pois os amigos do alheio já começam a praticar roubo de animais e com isto prejudicando a atividade de criação extensiva, tradição secular nesta região. Entre os vaqueiros, há muita amizade e respeito. Não há dúvida entre eles. Hoje, já pensam em criar uma associação para que esta tradição não desapareça.

Dr. Lima

Cruz/CE

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